12 julho 2007

Fracções

Acabei de encontrar uma melga caída, morta, ao pé do meu pc. Já nem me lembrava que à uma boa meia hora tinha tentado com um bater de palmas, apanhar esse insecto que nesta época do ano invade cada casa que tenha uma jenela aberta (acabei de apanhar outra, agora com um dedo contra o guarda-fatos que está à esquerda da secretária... tou com sorte hoje).
Aqui estou eu e o meu blog, companheiro de muitas noites de insónias e de noites mal dormidas.
Estava a lembrar-me antes de escrever, que era bom recordar os tempos que vivi a cada ano que passava, durante um mês, na terra dos meus avos maternos. Aí, durante um mês por ano tinha contacto com a natureza na sua mais pura realidade. O campo. O esplendor da noite estrelada. Nunca vi um céu como ali. E os morcegos que voavam na noite, em volta da luz do candeeiro que como um aspirador, chamava os insectos. O calor sem sentir a brisa do mar é terrível. E os cheiros das pedras. As casas velhas como aquela em que eu estava. Pedras feitas pela mão dos antigos, trazidas de longe, postas sobre outras pedras no seu conjunto a casa fazia-se. A loja, aquele espaço debaixo da casa, onde se guardava tudo o que se possa imaginar. As arcas com o pão, as pipas com o vinho, as enxadas, as foices e os martelos também. Lembro-me agora do meu avô. Pessoa simples mas que sabia mais que eu e penso que saberá sempre mais. Sabia as fases da lua, o tempo que ia fazer amanhã, como regar e plantar tudo. Conhecia os caminhos e as pessoas. Todos o conheciam. Todos o cumprimentavam quando passava na rua. Tinha eu doze, treze anos, quando passava com ele a caminho de casa. Se disser que parámos três vezes para provar o vinho dos vizinhos, não é mentira. Guardo dele os olhos azuis e a bondade com que me tratava.
Á minha frente tenho na parede um quadro, escolhido por mim de Ibo Dreyer. No canto inferior esquerdo uma fotografia de grupo dos camaradas do meu pai, amigos que ficaram desde os tempos da guerra de África. Cheguei a ir a um desses almoços. E ao início era muito confuso não conhecer aquelas pessoas que tratavam o meu pai como um amigo de à muito tempo. Fiquei a saber coisas que sempre me tinham intrigado, nessa fase da vida bem guardada do meu pai. A guerra não foi fácil para quem tinha dezanove ou vinte anos. E as perguntas foram saíndo da minha boca e respondidas por quem estava mais à mão. Fiquei a saber que não é só no nascimento e na morte que somos todos iguais. Na guerra também. Talvez adicionando os sentimentos e toda a vida que cada um levou para lá. Mas na vida de cada um, não sei se haverá um sentimento de igualdade e de grupo como ali. Sem isso muitos não tinham vindo de volta para a metrópole, Lisboa.
Para finalizar uma lembrança de menino. O cheiro da terra no Inverno, a chuva que molhava quem passava e que para atravessar a estrada punha os pés nas poças de água. Adorava ficar à janela a olhar a rua, as pessoas. O vidro esse, por estar tão perto dele embaciava. Não nos devemos aproximar demais do vidro da vida, podendo ele embaciar e não nos deixar ver a realidade como ela é. Neste momento tenho a janela aberta... e mesmo se fosse Inverno estaria escancarada...

1 comentário:

Urban Cat disse...

Essa janela é o reflexo dos teus olhos…

:)